Tenho um amigo que às vezes freqüenta a minha casa para trocar idéias sobre música, literatura e fotografia, três assuntos do nosso interesse comum e vez por outra ele me surpreende com uma história engraçada, melhor dizendo, um “causo”. Quase me acabo de rir com o último que ele me contou… Segundo me disse, um seu colega trabalho é filho de um pracinha, ex-combatente da Segunda Guerra Mundial e, por essa razão Hitler é um de seus temas prediletos. O pai conta dezenas de histórias do tempo da guerra, verídicas ou não, com uma convicção tão grande que se o interlocutor contestá-lo ou demonstrar o menor resquício de dúvida, o velho militar avança furioso, dedo em riste, exigindo respeito às suas cãs.
Numa visita a casa do veterano de guerra, o meu amigo foi surpreendido com a seguinte história, que o velhinho narrou mais ou menos nesse tom:
— Vocês querem saber a verdade sobre a morte de Hitler? Pois eu vou lhes contar a versão legítima de Braga! Os americanos se escoravam demais nos brasileiros. No dia 30 de abril de 1945 nós avançamos sobre Berlim, capital da Alemanha… Quando nós fomos prender o Hitler eles empurraram logo uma tropa de brasileiros no pelotão da frente. Eu era o cabeça da tropa e fui logo subindo uma escadaria, em busca do gabinete do temível ditador. Chutei a porta e fui logo gritando:
— Teje preso, ‘seu’ Adolfo!
Hitler tomou um tremendo susto, levantou-se acuado e me disse em tom suplicante, com voz de mulher falsa quando é flagrada pelo marido:
— Oh!! Por favorrr non me mate, soldado Oliveirrra!!!
O meu amigo não se aguentou e resolveu aparteá-lo com uma pergunta:
— Como é que o Hitler sabia seu nome, ‘seu’ Oliveira? Ele falava português?
O velho ficou vermelho de cólera, avançou para ele e retrucou aos berros:
— Tá duvidando de mim? Tá duvidando da minha palavra? O Hitler sabia meu nome porque estava escrito no bolso da minha farda, ‘seu’ burro: SOLDADO OLIVEIRA! Tá ouvindo? — E virando-se para o filho:
— É por isso, meu filho, que eu não gosto de contar essas histórias à gente ignorante!
— Que é isso, ‘seu’ Oliveira. Eu só lhe fiz uma pergunta… Perguntar não ofende. E daí, o que foi que aconteceu?
— Ora, quando ia avançar para prender o homem, ele abriu subitamente uma gaveta, retirou de dentro uma pistola cheia de balas, apontou para o próprio ouvido e PÁÁÁÁÁ! Caiu ciscando numa poça de sangue. Foi assim que morreu o Hitler, compreendeu?
* * *
Essa é boa para refletir sobre a índole do cearense. Ex-combatentes estrangeiros geralmente voltam doidos, invadindo escolas e supermercados e atirando a esmo, para tudo quanto é lado. Aqui no Ceará, os ex-combatentes, desde os tempos da Guerra do Paraguai, têm uma grande vantagem. Voltam mentindo. Ou melhor, fazendo humor de primeira linha.
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Por ARIEVALDO VIANNA – Texto e Inlustração