O Brasil inova e mostra ao mundo uma criativa modalidade de golpe: o golpe com data marcada

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Dos generais palacianos aos soldados que patrulham a fronteira brasileira em São Gabriel da Cachoeira, do investidor da Faria Lima ao vendedor de picolé da mais pacata cidade do interior, não há quem não esteja ciente de que no dia 2 de outubro, ali por volta das 20h, quando soubermos o resultado do primeiro turno das eleições, Bolsonaro não aceitará qualquer resultado diferente de sua vitória. Isso está dito, documentado e analisado. Já saiu da boca do próprio presidente, já foi indicado por ministros do STF, já foi objeto de análise de colunistas, pesquisadores e jornalistas. Nenhum de nós poderá dizer que foi pego de surpresa.

Então, por que seguimos dia a dia, semana a semana vivendo, falando de política e assistindo a Bolsonaro pisotear o pouco de democracia que conseguimos construir a duras penas como se nada estivesse acontecendo?

Não vou me aprofundar nessa reflexão, deixarei que você tire suas próprias conclusões. Quero enveredar por outro caminho, prefiro ser prática e propor que pensemos adiante. Sendo direta: o que podemos fazer diante da tentativa de golpe que está por vir?

Talvez você também tenha algumas respostas para isso. Geralmente, algumas dessas respostas são muito genéricas. Por isso quero propor que pensemos em algo bastante concreto. Tirando as decisões mais incisivas do STF, quais foram os momentos em que Bolsonaro mais se sentiu enfraquecido? Quando foi que a sociedade conseguiu colocá-lo numa posição mais frágil? Aliás, em que momentos a sociedade conseguiu inclusive estimular alguma atitude do STF?

Não tenho dúvida: quando o jornalismo foi para cima dele e conseguiu expor seu despreparo, casos de corrupção e a negligência no trato da pandemia. Cito apenas três casos emblemáticos: Vaza Jato, rachadinha + envolvimento de Flávio Bolsonaro com a milícia e, mais recentemente, o orçamento secreto.

Nos dois primeiros casos, o Intercept esteve na linha de frente da cobertura. E não tenho dúvida de que somente o jornalismo independente reúne os atributos necessários para ir para cima de Sergio Moro e para investigar as milícias.

Citei três coberturas grandes, importantes e que mexeram diretamente com o presidente e seu governo militar, mas pense bem: a CPI que tratou da pandemia teria sido a mesma sem o trabalho de jornalistas realmente comprometidos com o interesse público? Eu acho que não.

Ao que parece, o caminho está dado. Entre as muitas coisas que podemos fazer para reagir ao golpe com data marcada, há uma que é concreta, que é eficaz e que já mostrou que tem poder de fogo. Trata-se do jornalismo contundente, corajoso e que é capaz de chegar de verdade na boca do povo. Capaz de mostrar o que Bolsonaro realmente é: o responsável por uma inflação avassaladora, chefe de uma família envolvida em diversos esquemas que precisam ser investigados e líder de um Brasil do atraso, do garimpo assassino, da violência, da morte.

Esse tipo de jornalismo custa caro, é perigoso e dificilmente será feito pelos grandes grupos de mídia — aqueles que têm dinheiro, mas também têm muitos interesses. Basta você pensar em como Sergio Moro até hoje é tratado nos grandes jornais brasileiros. Por isso, não há alternativa: é urgente fortalecer veículos independentes.

Fonte: Táia Rocha – The Intercept_Brasil

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