Chico César faz “crítica esperançosa” e enfrenta o fascismo

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Novo álbum de inéditas do músico reúne inquietude, luta e amor


O nono álbum de inéditas de Chico César, O Amor é um Ato Revolucionário, é um manifesto de um artista fértil, inquieto com a realidade, e tradutor inspirado da luta e do amor.


O cantor e compositor paraibano acaba de lançar um trabalho desconcertante. Todas as 13 faixas são de sua autoria (letras e melodias). Algumas canções já haviam sido divulgadas nas redes sociais do artista. Parte das composições têm forte acento político-social.


Senti necessidade, a partir de 2015, com as tintas do fascismo presentes no dia a dia da política e nas ruas do País, de comentar e expressar em música meu sentimento e minha visão desse momento”, afirma Chico César.


Essas canções trazem minha crítica esperançosa de superação. Penso que o momento é de enfrentamento, sim. No terreno das ideias, no campo parlamentar e jurídico, mas o mais importante é que o campo progressista e popular não se deixe acuar e ocupe as ruas. Acuados devem ficar os fascistas, sem direito a voz, pois muitos de seus porta-vozes, inclusive, estão mudando de campo.”


Longas faixas musicais exaltam a liberdade


Mas não é só nas palavras que Chico César mostra vigor. O novo trabalho tem instrumentações densas, extensas e soltas. Em quatro músicas, a gravação passa de seis minutos.


Quis me sentir livre com os músicos, ao falar sobre liberdade. Por isso trouxemos esse espírito do fim dos anos 1960, que invade os anos 1970: improvisação, orientalismos, experimentalismo com coros e instrumentos, música sem pressa de entrar na caixinha para caber num tempo de rádio ou de ouvidos viciados nos três minutos e pouco que determinaram que as canções devem ter”.


A faixa-título O Amor É um Ato Revolucionário abre o álbum, com um longo solo do guitarrista paulistano Luiz Carlini, seguido de Minha Morena – as duas são canções de afeição.


Luzia Negra (com novo longo solo de guitarra, dessa vez do próprio Chico), que faz referência ao fóssil humano (Luzia) mais antigo do continente que enfrentou o incêndio do Museu Nacional, e As Negras exaltam a raça.


De Peito Aberto tem a participação da cantora Agnes Nunes, uma paraibana de 17 anos. Depois vem Lok Ok, Like e History. As quatro composições são encontros e desencontros nos tempos de internet.


Provocações ao sistema


A partir da nona faixa, o álbum exprime com clareza as aflições do artista, com exceção da música Mulhero, nome também de um show de Chico feito no ano passado.


O Homem Sob o Cobertor Puído chama a atenção daqueles que andam nas ruas sem olhar para o lado: “Você que vai ver ao concerto com seu fraque / Não vê o homem caído na onda do crack”.


E lembra aqueles que fingem esquecer o fruto da violência: “Depois vai com os amigos a um restaurante chique / No banheiro dá um tiro que é pra manter o pique / Mas apoia que a polícia mate traficantes da favela”.


Eu quero quebrar, que tem outra versão (bônus) no fim do disco, é mais aguda: “Eu quero que a cidade derreta / Se ninguém aqui é cidadão / Vou sair do coma pro cometa / Cometer loucura e revolução”.


Pedrada, a décima segunda faixa, o ápice, segundo o músico ultrapassou 1 milhão de visualizações na versão voz e violão nas redes sociais bem antes de seu lançamento. Abaixo, segue a composição reproduzida na íntegra:


Cães danados do fascismo

Babam e arreganham os dentes

Sai do ovo a serpente

Fruto podre do cinismo


Para oprimir as gentes

Nos manter no escravismo

Pra nos empurrar no abismo

E nos triturar com os dentes


Ê república de parentes pode crer

Na nova Babilônia eu e você

Somos só carne humana pra moer

E o amor não é pra nós


Mas nós temos a pedrada pra jogar

A bola incendiária está no ar (vai voar)

Fogo nos fascistas

Fogo, Jah!”